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Os Incidentes nas Festas de Alcochete

Neste ano em que a festa brava foi injustamente difamada, por quem não sabe do que fala, e que para infelicidade sua jamais saberá, publicamos no nosso site a reflexão de um aficionado e amigo.
29 de Setembro de 2015 - 20:29h Pensamento por: - Fonte: http://www.georgetownframeshoppe.com/artwork-info/picasso/tauromaquia - Visto: 3507
Os Incidentes nas Festas de Alcochete

Diz um antigo ditado que as águas demasiado puras não têm peixes.

Eu, cidadão europeu do século XXI, o que digo é que é castradora uma

sociedade asséptica e refém do politicamente correcto.

Ocorreu-me esta reflexão a propósito dos incidentes com manifestantes que

protestavam à porta da praça contra a realização da tradicional corrida de

touros por ocasião das festas populares de Alcochete.

Há algum tempo, fui com um amigo a um esgotado cinema de Lisboa ver um

documentário acerca da pesca no Mar do Norte. Parece que era utilizada

uma peculiar técnica de filmagem com câmaras fixas no barco e aquilo

acabou premiado. Do que vi, retenho uma enorme orelha de pescador que,

em plano único, se mostrou durante uns três minutos e dezenas de peixes a

serem esventrados, decapitados e outros, fora de água, agonizantes e à espera.

Não valerá a pena grandes elaborações acerca da violência e das suas

diversíssimas representações. O plano que me parece relevante analisar é o

da mera liberdade.

Devo eu, por não ser capaz de achar sentido ou ver a beleza de uma

expressão artística tentar impedir que outros a apreciem, incomodar-me com

a sua existência ou manifestar-me em favor da sua proibição?

Bem sei que é tentador ceder aos esteriótipos de uma direita ignorante e

trauliteira versus uma esquerda jactante e urban chic. Mas, mesmo a dar-se

o caso de assim ser, sempre digo, sinceramente, que a mim me incomodam

tanto uma como outra. Que é nada!

Um povo que viveu tanto tempo em ditadura com o culto do gosto único dos

três F´s (Fado, Futebol e Fátima) tem obrigação de defender, consagrando

em lei, a tolerância e a liberdade. Por isso, acredito que enquanto existir uma

democracia no meu soberano país, no pleno exercício da minha cidadania,

eu serei livre para escolher ir ver um combate de boxe, que até é modalidade

olímpica, um documentário de pesca que não entendo, ou essa manifestação

de portucalidade que é uma corrida de touros. A questão é que, se aqui me

sinto muito mais a gosto e estou a participar numa actividade, igualmente

legal, que faz parte da matriz cultural em que fui educado, porque tenho eu

de ser incomodado e agredido para aceder ao meu lugar de simples

espectador?

 

Joaquim Varela do Nascimento

Ervedal-Avís

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