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Uma vida de Campino a "Preceito"

Foi com um brilhozinho nos olhos que João Preceito, 63 anos reformado por motivos de saúde, falou da sua paixão pelos toiros e cavalos.

24 de Janeiro de 2011 - 21:15h Notícia por: - Fonte: - Visto: 4236
Uma vida de Campino a

Foi com um brilhozinho nos olhos que João Preceito, 63 anos reformado por motivos de saúde, falou da sua paixão pelos toiros e cavalos. Um homem do campo, humilde que colocou simplicidade nas suas palavras. A vida de Campino, um trabalho árduo que começava de manhã bem cedinho e prolongava-se até ao pôr-do-sol. Na campinagem doutros tempos, fazia-se um pouco de tudo não era só lidar com os toiros. A história de uma vida levada a Preceito!

Taurodromo: Como surgiu o gosto pela vida de campino?
João Preceito: Começei aos sete anos na companhia de meu pai. Já o meu avô era campino. Comecei na casa Prudêncio na Azambuja, era ajudante do meu pai, no tempo em que os bois de trabalho lavravam. Depois fui parar à casa Cabral de Ascensão, e aí fiz os meus 11 anos. Com 17, fui para a casa Oliveiras, Irmãos. Casei aos 18 anos, fui para a tropa e formei-me na área dos cavalos desde obstáculos, à dressage. Sou um apaixonado pelos cavalos. Saí da tropa, fui para a casa dos Duques de Palmela, cuja ganadaria por sua vez foi vendida ao Sr. José Luís Dias. Daí vim parar à companhia das lezírias, para um picadeiro. As coisas não correram bem, e regressei novamente á ganadaria Oliveiras,Irmãos, até ter sido reformado por invalidez..Tenho 3 filhos, os três montam bem a cavalo. O mais novo, o" Janica" seguiu as minhas pisadas é neste momento o maioral da casa Silva.

Taurodromo: O que faz o campino no seu dia-a-dia?
João Preceito:
Na minha altura, para se ser campino, não era só andar a cavalo a lidar com os toiros. Era arranjar arames, portanto seria preciso um alforge que se usava na garupa do cavalo e que tinha dentro uma pá de valar, um martelo, alicate, preguetas. Agora há brigadas para fazer isso. A primeira coisa que fazíamos era agarrar o cavalo que andava à solta na tapada dos cavalos. Em quase todas as herdades, isso acontecia. Agarrava-se o cavalo, dava-lhe um pouquinho de ração, aparelhava-o e ia beber o café com o pão torrado ou com "conduto" que sobrava do jantar. Dava ração aos toiros, novilhos ou às vacas. Os animais ficavam na cerca no "acarro", dava mais ração ou feno ao cavalo e ia almoçar. Era um trabalho rigoroso. Depois de almoço voltava ao campo e era até ao pôr-do-sol. Era um trabalho muito cansativo e estava muito preso.
Actualmente há poucos jovens e os poucos que há "já sabem tudo" (risos).

Taurodromo: Ser campino também tem os seus riscos?
João Preceito: Eu tenho muitas cornadas no meu corpo e não fui toureiro. Era picador, piquei muito novilho e muita vaca. Muitas vezes não colocava protecção. Os picadores em Espanha usam protecção, três cornadas que tenho na perna direita, sabe-se lá se não foi por não ter protecção. O campino quando havia uma tenta normalmente era ele que picava os toiros.

Taurodromo: Como era antigamente com as cheias?
João Preceito: Era muito sacrifício. Morria muito gado, e quem vivia no campo em barracas ficava sem as "mantas". Se na casa onde trabalhava não houvesse campinos suficientes para mudar o gado para outra herdade, tínhamos de ir aos outros ganadeiros, e maiorais para nos irem ajudar. Chegámos a passar na recta do cabo com toiros para a charneca, chegávamos a andar oito dias fora de casa, com a barba grande e sujos de lama quando regressávamos as mulheres nem nos reconheciam. Por vezes havia patrões que compensavam outros que não.

Taurodromo: Depois temos também as entradas de toiros?
João Preceito: Nessa altura vinham-se buscar os toiros ao campo a pé passava-se por debaixo da ponte de Vila Franca junto à linha do comboio. Metíamo-nos pela estrada fora. Agora já não é bem assim. Por exemplo o toiro português se não o picassem iam agarrados aos cavalos nem precisavam de cabrestos.

Taurodromo: Os toiros antigamente tinham mais bravura e nobreza?
João Preceito: Eu julgo que antigamente o toiro estava mais convivido com os cavalos e com a "gente". O lugar dos potros era junto aos novilhos. Eram guardados na pastagem. Os toiros vinham às gamelas para comer, ao som da voz do maioral portanto havia um convívio com o cavalo e o homem.

Taurodromo: Concerteza que tem muitas histórias que viveu em campo para contar?
João Preceito: Uma das histórias é muito simples. Passou-se na Companhia das Lezírias. Andava a cavalo numa égua ¾ de sangue inglês com o ferro da companhia, com um garraio cruzado, já com os pitóns granditos, portanto eu ia na égua, e o chão estava molhado e tinha uma cobertura em palha eu vinha do lado direito do garraio com o Zé Vital e grito, oh Zé! Aguenta um bocadinho, assim que meto o bico ao novilho, o novilho cai, a égua não conseguiu segurar-se caiu e fiquei com um pé entalado no estribo. Fui levado ao rojo cerca de 400 passos. Parti dez dentes arrancou-me a parte de cima da "melância" esfolei uma perna e um braço. Ficou na história.

Taurodromo: Quais eram e são os seus toureiros de eleição?
João Preceito: Gostava muito de ver tourear o Simão da Veiga, O Sr. Núncio, o Manuel Conde com os ferros frente a frente. Actualmente gosto muito de ver o António Telles, pelo cuidado que ele dá ao cavalo. No toureio a pé estivemos muito bem uns anos com o Vítor Mendes.

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